A liberação do cultivo da cannabis para fins medicinais e industriais no Brasil certamente impulsionará o País a se posicionar em outro patamar econômico perante o mundo. Cabe ao plenário da Câmara e do Senado sancionarem o Projeto de Lei 399/15, que autoriza o plantio para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais. No entanto, independentemente disso, é preciso destacar que a criação do ecossistema brasileiro já vive um processo bastante evoluído, com o surgimento de startups made in Brazil atentas às demandas dos mercados interno e externo.
Para exemplificar, destaco três startups que demonstram claramente o encadeamento dessa atividade, que vai desde o melhoramento genético da semente até a elaboração do produto final.
Acelerada pela The Green Hub, a ADWA Cannabis (adwacannabis.com.br) atua com melhoramento genético, biotecnologia e processos. Por meio de muita tecnologia, as sementes são mapeadas para se adaptarem a diferentes tipos de solo e clima, medida fundamental para um país tão grande quanto o Brasil. A partir desses estudos, os agricultores terão acesso a variedades apropriadas para diferentes finalidades, seja para produção de medicamentos ou de fibras, por exemplo.
Já a Kaneh Bosm Genes (kanehbosmgenes.com.br) pretende alcançar o mercado global a partir do cultivo aquapônico, produção realizada em sistema fechado e automatizado, com aplicação de técnicas de melhoramento genético e desenvolvimento de cepas. O cultivo é totalmente livre de agrotóxicos e fertilizantes químicos, resultando numa produção energeticamente eficiente, de baixo consumo de água e com custo reduzido.
A terceira startup, entre muitas que poderia citar aqui, é a The Dogon’s (instagram.com/thedogonss), que atua na área industrial e comercial com produção e comercialização de bebidas probióticas manipuladas com cannabis. A meta é oferecer ao mercado produtos com ingredientes naturais, sem conservantes e com baixo teor de calorias.
Como se vê, com liberação ou não do plantio no Brasil, os empreendedores não estão com os braços cruzados. Mesmo porque, assim como importamos matéria-prima para a produção de vacinas contra a Covid-19, podemos abastecer o mercado interno com insumos elaborados em outros países. É ideal? Não, mas é como aquele antigo ditado que coloca o ótimo como inimigo do bom. No caso, “do possível”, até que nossos governantes se deem conta de que estão emperrando o desenvolvimento de produtos benéficos a milhões de brasileiros.
A fiscalização dessa cadeia produtiva, preocupação pertinente ao tema, envolve todo o rastreamento do processo. É o chamado Seed to Sale. A rastreabilidade do produto pode começar na semente e seguir até o blockchain. Essa supervisão garante ao governo e aos consumidores qualidade e segurança.
É preciso destacar, ainda, a recente aprovação do Projeto de Lei Complementar (PLC) 146/19, mais conhecido como marco legal das startups. Poderia ter sido mais ousado? Sim, com certeza, porém, representa um começo. A partir de agora, os empreendimentos têm novos horizontes que facilitam a captação de recursos. Além disso, o ambiente fica melhor para investir com mais segurança em pesquisa, desenvolvimento e projetos inovadores de startups, afetando diretamente o setor da cannabis no Brasil.
A possibilidade de contar com um sandbox regulatório também contribui para a criação de ambiente favorável à inovação, acompanhando rapidamente os constantes avanços tecnológicos de vários setores da economia. Para os governos, o sandbox permite controlar riscos inerentes à inovação e testar regramentos em fase beta. Assim, calibra as futuras regulamentações do mercado sem comprometer os modelos econômicos constituídos.
O Brasil precisa olhar os erros cometidos por outros países e evitar a sua reprodução por aqui. Na área de cannabis, há atualmente muita matéria-prima sem destino pelo mundo. Pensar apenas como exportador de commodities é pouco para esse imenso País. Temos condições de criar novas tecnologias e exportar inovações. Há muitos empreendedores já fazendo a sua parte. Cabe aos legisladores fazerem a deles. Rapidamente.
*Marcelo De Vita Grecco é co-fundador e
diretor de Desenvolvimento de Negócios da The Green Hub